terça-feira, 14 de abril de 2015

História da Associação dos Surdos do Ceará



Trajetória e identidade estigmatizada:

a História da Associação dos Surdos do Ceará

Eudenia Magalhães Barros *
Orientador: Profª. Drª. Rejane Vasconcelos Accioly Carvalho




OBJETIVO
O objetivo principal desta pesquisa foi tentar obter o máximo de informações
sobre a história da Associação dos Surdos do Ceará – ASCE –, procurando investigar
quais os motivos da sua fundação e os ideais empregados nela; o porquê
de seus fundadores terem acreditado ser importante a criação de uma associação
de Surdos, qual função lhe era destinada e a sua atuação na vida dos Surdos
cearenses nos dias de hoje.
No decorrer da pesquisa, outros objetivos foram sendo delineados: conhecer
a trajetória dos indivíduos Surdos que participaram da fundação dessa Associação;
realizar um vínculo entre a história individual e a constituição dos valores
que a ASCE carrega; perceber a construção de uma identidade a partir das características
homogêneas que existiam.

METODOLOGIA
As estratégias metodológicas utilizadas foram, principalmente, a coleta de
dados de fontes primárias, através de entrevistas, depoimentos e conversas informais
com os sujeitos responsáveis pela idealização e constituição da associação;
pesquisa bibliográfica; observação participante e produção do diário de
campo. A escolha dos entrevistados foi baseada na preocupação em conseguir
coletar o máximo de informações sobre a Associação, já que inexistia uma documentação
de sua história. As pessoas designadas pela comunidade como seus
representantes foram as escolhidas.
O intuito foi coletar e cruzar as informações que pudessem construir uma
cronologia de eventos sobre a fundação da ASCE. Foram entrevistados três expresidentes,
uma diretora social, um ex-diretor de assuntos esportivos, três associados,
e uma associada que é conhecida também pela sociedade ouvinte e cumpre
hoje o papel de representar os Surdos junto ao poder público.
As demais fontes de pesquisa sobre a história da ASCE foram: um documento
escrito pela idealizadora e co-fundadora da ASCE, um relato organizado pela
atual diretora social e registros fotográficos. A realização das entrevistas assume
um caráter bastante peculiar. Os Surdos que foram entrevistados se comunicaram
comigo através da Língua Brasileira de Sinais, a LIBRAS, o que exigiu a
presença de um intermediador, a figura do Intérprete de LIBRAS – ILS. Todas
as entrevistas foram filmadas, e posteriormente traduzidas e transcritas pelo intérprete
Jonathan Sousa, graduando em Letras - LIBRAS pela UFC.

RESULTADOS
A ASCE tem uma história bastante particular, porém não desvinculada do seu tempo
histórico. Por meio de entraves que perduram há séculos, situações que justificaram a sua
criação e manutenção na sociedade estão diretamente ligadas aos fatores sócio-históricos.
As estruturas pré-existentes conduziram à sua existência, e a construção social do estigma
da surdez permeou a vida não somente desses indivíduos, mas também de Surdos do Brasil
e do mundo inteiro. A própria estigmatização do indivíduo Surdo foi o fator crucial para
o surgimento de uma associação que o unisse aos seus semelhantes, e desenvolvesse, através
de uma língua própria, uma percepção diferente, mas não inferior, em relação ao
mundo e a sociedade.
A intencionalidade da criação da ASCE foi percebida como sendo um meio de resignificação
do estigma, que propõe mostrar para a sociedade ouvinte que a surdez não é
considerada como um defeito, mas sim como uma diferença; percebeu-se que houve um
rompimento, por parte dos Surdos, com a perspectiva pejorativa e “diminutiva” que as
pessoas normais construíram para se referirem a eles a partir da tentativa de demonstrar à
sociedade a capacidade organizacional que eles têm.
As Identidades Surdas, tão heterogêneas entre si, se baseiam no estigma em comum para
enraizar idéias de movimentação social e luta pelo respeito e geração de novas oportunidades
para pessoas com surdez. A ASCE, que além de oferecer laser e interação entre os
Surdos, busca a evidenciar a existência do indivíduo Surdo na sociedade com alguém que
também possui qualidades e defeitos não condicionados especificamente ao seu estigma.
Todas essas características implicam na forma de interação e concepção da idéia da importância
da ASCE e da LIBRAS, como também a idéia de Comunidade Surda. Através
do auto-reconhecimento do Surdo através de outro indivíduo que possui as mesmas marcas
estigmatizantes que as suas, foi gerado um sentimento de coletividade e associativismo,
considerando que muitos deles não tinham amigos ou parentes em comum, sendo unidos
principalmente pela vontade de sentir-se acolhidos e não vistos como anormais.

Referências bibliográficas
CRESWELL, John W. Projeto de pesquisa: Métodos qualitativo, quantitativo e misto. 2 ed. Porto
Alegre:Artmed, 2007 FRIZANCO, Mary L. E. HONORA Márcia. Livro ilustrado de Língua
Brasileira de Sinais: Desvendando a comunicação usada pelas pessoas com surdez. Ciranda
Cultural, 2009. LEITÃO, Vanda Magalhães. Instituições, Campanhas e Lutas: História da Educação
Especial no Ceará. Fortaleza: Edições UFC, 2008. GOFFMAN, Erving. Estigma: notas
sobre a manipulação da identidade deteriorada. 4.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. MOURA,
Maria Cecília. O Surdo: caminhos para uma nova identidade. Rio de Janeiro: Revinter, 2000.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Renovar a teoria crítica e reiventar a emanciapação social. São
Paulo: Boitempo, 2007. RAMOS, Clélia Regina. LIBRAS: A língua de Sinais dos Surdos brasileiros.
Disponível em: http://www.editora-arara-azul.com.br/pdf/artigo2.pdf. Data de acesso: 03
de junho - 2010.

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