Onde o amor fala mais alto
No dia nacional do surdo conheça a história de superação da família Garbim Diesel
Sapucaia do Sul - Parece enredo de filme, mas é uma história real que há pelo menos seis anos vem emocionando os moradores do Vale, numa linda lição de amor contra o preconceito e os obstáculos impostos pela vida. Um casal de jovens surdos se apaixona, casa-se e tem uma filha. A criança, ouvinte, logo aprende a língua de sinais e torna-se a intérprete dos pais nas mais diversas situações. Felizes, eles resolvem aumentar a família e se descobrem pai e mãe de mais uma menina, esta porém é diagnosticada com glaucoma já nos primeiros dias de vida. Com a vista bastante comprometida, a pequena passa por três cirurgias. Os médicos, no entanto, não dão certeza quanto a recuperação total da visão. Mesmo assustados em relação a maneira como vão encarar o futuro, os dois aproveitam o tempo presente para curtir a família da melhor maneira possível, com doses extras de carinho e compreensão.
A história, protagonizada pelo programador e professor de libras, Ivan Rogério Diesel, 38, pela pedagoga e também professora de libras, Carine Garbim Diesel, 29, e pelas filhas deles, Júlia Emmanuelli, 6 e Laura, 4 meses, chama a atenção pela forma leve e positiva como é encarada. Moradores de Sapucaia do Sul, eles enfrentam as dificuldades com bom humor e têm na pequena Júlia um elo "
entre dois mundos. “Ainda há muito preconceito em relação aos surdos e a nossa principal dificuldade é a comunicação. Para fazer coisas Confira
as simples como ir ao médico preciso contratar uma intérprete, já que é difícil encontrar alguém que saiba libras em todos os lugares”, comenta Carine. “Já temos uma lei que oficializa a libras como a segunda língua do País. No entanto, não há o incentivo necessário para que um maior número de pessoas aprenda. Acho que deveriam haver mais cursos gratuitos, para oportunizar a mais interessados este conhecimento”, reforça, Ivan. Segundo ele, uma das principais reclamações da Sociedade de Surdos é a falta de conhecimentos básicos da língua por parte da população ouvinte. “Sabemos que o português é uma língua complicada de se dominar. Mas sentimos falta de sinais básicos, ou então que as pessoas entendam a necessidade de se fazer gestos, pois o surdo, de alguma forma, entenderá”, completa Ivan.
A alfabetização de Júlia
Júlia, a menina falante e de olhos azuis tão expressivos quanto ela, é coda, como são conhecidos os filhos ouvintes de pais surdos. Com apenas 6 anos, Júlia já compreende a importância dela na família, seja na interação entre os pais e a caçula, seja na apresentação de um modo diferente de se comunicar para o resto da turma na escola de Educação Infantil Primeiros Passos. “Eu ensino meus colegas, mas nem todos aprendem. Muitos me perguntam sobre os meus pais. Sempre achei fácil de conversar com eles”, conta. Em relação a irmã, Júlia admite sentir um pouco de ciúmes, mas também não nega a ajuda. “Não sei trocar fraldas, mas cuido dela. Quando ela está chorando, eu canto para ela se acalmar e dormir. Sempre dá certo”, ensina.
Segundo a mãe, a alfabetização de Júlia em ambas as línguas foi tranquila, potencializada pela ajuda de familiares e professores. “O primeiro contato dela com a libras aconteceu quando ela era bebê. Somente depois dos seis meses ela começou a responder. Na escola também começaram a ensiná-la. Em casa ela assistia televisão e se comunicava com a avó e a sobrinha” diz Carine.
Os desafios com a bebê
Em relação a pequena Laura, os pais preferem não sofrer por antecipação. Querem esperar o diagnóstico final para só então definirem o que fazer.“Foi bastante difícil. Quando ela nasceu ninguém esperava que ela fosse desenvolver este problema. Toda a família ficou bastante em relação ao futuro. Mas prefiro pensar no hoje, em como ela vai reagir ao tratamento”, afirma Carine. Mesmo com as dificuldades, eles não deixam de amar e de aproveitar todos os momentos ao lado da filha. “Sempre vamos aceitá-la como ela é porque a amamos muito. Acreditamos que, independentemente do que aconteça ela vai se adaptar muito bem a nossa realidade”, completa.
Respeito a língua de sinais
Natural do Mato Grosso, Carine morou até os 13 anos em Caxias do Sul e conheceu o hamburguense Ivan, na Sociedade dos Surdos do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre. A surdez de Carine teve origem ainda durante a gestação, quando a mãe teve rubéola. Já Ivan, teve meningite aos três anos que deixou como sequela a perda da audição. Casados há 10 anos, eles celebram a vida com muita diversão, viagens e partidas de vôlei e basquete. Para servirem de inspiração a outras famílias eles ensinam o segredo de uma convivência feliz e harmoniosa. “Os pais precisam participar da escola, pois é lá onde começa o ensino dos filhos. Pensamos que se Deus nos fez com algo faltando, temos de aceitar e trabalhar para fazermos nossos filhos pessoas melhores a cada dia”, diz Carine. Quanto a melhoria nas relações, especialmente com pessoas ouvintes, Ivan também ensina. “Sabemos que deve haver participação e aceitação desde pequenos. Também é fundamental que as pessoas respeitem a nossa língua”, conta.
Adaptação dos professores
Diretora da escola de Educação Infantil Primeiros Passos, a pedagoga Sílvia Regina Boll, 50, lembra que o ensino de libras no local teve início há sete anos. “Tivemos um aluno filho de mãe surda e pai ouvinte. A partir dali achamos importante incluirmos a libras no nosso currículo e na formação dos nossos professores. Hoje nossos alunos têm aulas de língua de sinais uma vez por semana e todas as nossas professoras sabem, pelo menos o básico para se comunicar”, conta. Para Sílvia falta divulgação e preparo por parte da sociedade ouvinte, da importância do ensino e aprendizado da libras. “Quando a gente conhece a libras acaba se apaixonando. As pessoas precisam quebrar as barreiras e perder a vergonha de falar com os surdos”, opina. Formanda no curso de intérprete de libras, Natália Druzian, 28, diz que cultivou interesse pelo aprendizado quando se viu frente a uma situação embaraçosa. “Ficava mal em atender pais surdos na escola e não conseguir me comunicar, ficando dependente da escrita numa folha de papel. Como intérprete, acredito que a maior dificuldade seja a constante formação. É necessário buscar conhecer melhor a cultura surda e, como com qualquer outra língua, praticar bastante”, explica.
Dia nacional do surdo
Hoje é celebrado em todo o país o dia nacional do surdo. Internacionalmente, no entanto a data escolhida pela Federação Mundial dos Surdos para lembrar as lutas históricas por melhores condições de vida, trabalho, educação, saúde e dignidade é o 30 de setembro.
No Brasil, o dia 26 de setembro foi escolhido para lembrar a data da inauguração da primeira escola para surdos, fundada em 1857 no Rio de Janeiro. No local, atualmente funciona o Instituto Nacional de educação de Surdos – INES.
Renata Strapazzon - renata.strapazzon@gruposinos.com.br (mailto:renata.strapazzon@gruposinos.com.br)
No dia nacional do surdo conheça a história de superação da família Garbim Diesel
Foto: Ivan de Andrade/GES
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fonte: Jornal VS e facebook.